sexta-feira, 20 de março de 2009

Desperdiçar um tesouro?

No post anterior, punhamo-nos um pouquinho ousados, tentando reformar conjuntamente as ortografias galega e portuguesa para convergerem quase-quase completamente. A verdade é que seria um’a boa ideia... a longo prazo. Mas, polo momento, cumpriria explorar um’a aproximaçõ das letras galegas às portuguesas... se se quiger por parte dos galegos fazê-lo. Os que pensamos assim é porque achamos que o galego pode-se vestir desde jeito gráfico sem deixar de ser o que é. Muitos pensamos que nõ fai falta recorrer ao português padrõ. E nõ só que nõ faga falta, é contraproducente e desnecessário. Nõ fai falta forçar a escrita até límites onde já nõ se corresponde com as formas galegas para demonstrar que o galego e o português sõ a mesma língua: já o sõ, assim como estou a escrever, em galego-galego, galego-português ou como se quiger, mas sempre galego, nõ só português (ainda que se diga “da Galiza”).

O que estou a escrever nõ fai falta pronunciá-lo de maneira rara ou alheia às falas galegas. As formas que nõ sõ utilizadas na norma dominante, nõ deixam por isso de sererm prefeitamente galegas. ‘Muito’, ‘aldeia’, ‘irmão’ –pronunciado irmáo ou irmáu- sõ formas galegas amplamente utilizadas nas nossas falas que, para além, coincidem com as portuguesas. Por que nõ utilizá-las? ‘Possível’, ‘cançõ (ou cançom)’ ou ‘Galiza’ sõ formas históricamente galegas, as genuinas formas galegas, ainda que fossem substituidas no uso comum polas equivalentes castelãs ‘posivle’, ‘canciõ’, ‘Galícia’, igual que outras como ‘Dios’, ‘puevlo’, ‘pulpo’, ‘ghueves’ ou... ‘galhego’. E acontece que, novamente, as formas autenticamente galegas sõ equivalentes às portuguesas... tens que ver!

O caso é que se escrevemos o galego à castelã, poucas diferenças haverá a respeito da ortografia dominante no galego atual. Já entraremos noutra ocasiõ mais a fundo nesta questõ e como se forom justificando as escolhas que fundamentan a ortografia dominante do galego em supostas razões pedagógicas (nunca históricas ou etimológicas) para favorecer a aprendizagem de indivíduos alfabetizados na língua castelã, razões que mostram a dependência e dialetalizaçõ que revelam e imponhem estas escolhas. Mas ao escrevermos o galego com ortografia substancialmente idêntica à portuguesa, vemos, nõ só que isto é perfeitamente possível, senõ que, para além, o produto é práticamente idêntico, cousa que nõ acontece ao utilizarmos a ortografia castelã, o que e revelador de que nos encontramos perante variantes da mesma língua, ao compararmos galego e português, mas claramente nõ se compararmos com o castelão, onde achamos a expressõ de duas línguas plenamente diferenciadas. Isto já o pudemos comprovar num post anterior, “Versos só galegos?”, ao transcrevermos um’a poesia escrita num galego bastante espontâneo a um galego reintegrado e mesmo a um português padrõ sem que em nengum’a fase do processo se pudesse dizer que a língua que empregávamos já era outra distinta à do texto original (ou à da fase anterior do processo).

Isto é um’a questõ meramente lingüística. Parece coerente que variantes da mesma língua tenham que se escrever dum’a maneira semelhante. Podem se agregar razões sociais mesmo políticas de todo tipo, mas bater pé firme nesses argumentos poíticos é, acho eu, diminuir o valor e o protagonismo dos argumentos lingüísticos. O galego e o português serem a mesma língua é um feito lingüístico. As conclussões de tipo político que se podam tirar de este feito sõ posteriores e secundárias. Sõ conseqüências e nõ provas desse feito. Enfim, a letra ‘ñ’ ou o dígrafo ‘nh’ nõ tenhem ideologia.

Devem-se, podem-se desperdiçar os tesouros? Podermos utilizar um’a língua que compartem centenas de milhões de pessoas é um’a autêntica bençõ e um precioso presente. Poderá ser também um maravilhoso futuro?